sexta-feira, 21 de março de 2008





dois Poema de Aline Carlos



sem titulo




Absorta, te busquei no movimento dos outros carros.
Por vezes, de tanto olhar para os lados, quase morri.
Foram semanas assim.
Trilhas sonoras de cada instante meu com o teu, fiz.
Procurando o que não havia e o que havia de ser só na minha cabeça, na minha imaginação.
Eram dias que não passavam.
Eram noites em claro...
O juízo imperfeito.
O coração em descompasso.
Cega.
E do encontro que se deu, não passara de boa sorte e, com sorte, até um dia, quem sabe.
E louca, mais uma vez me perdi.




Oração





Todos os dias sem muito esforço

Ela lança olhares para o céu

Buscando uma solução

À noite, as contas do terço saltam-lhe os dedos

E numa busca por dias melhores

Procura por uma intercessão divina

Redundante, se põe a dizer:

Ave Maria, minha Nossa Senhora!

Valei-me, meu pai!

Meu Deus do Céu!

E de todas as lágrimas que já cobriram o seu manto materno...

Eis que não se demora a derramar mais uma.

Não chores mãe!

E com suas mãos e corpo já tão sofridos

Das palavras grosseiras

Das mentiras contadas

Dos dias perdidos

Dos anos de tantas lutas

Ela, incansavelmente, faz um carinho no rosto,

olha nos olhos, esforçando-se por um sorriso e diz:

Deus proverá, minha filha!

sábado, 12 de janeiro de 2008


a sensualidade na obra de d’barros

“A arte é a anotação nítida de uma impressão errada (falsa)”

(Fernando Pessoa)

Escrever sobre a escultura na obra de D’Barros, na minha atual situação, não é coisa fácil, mas prazerosa e quem sabe um pouco arriscada. Assim começo a descrever o que minhas mãos e meus olhos podem tocar com o pensamento. E como disse o nosso caro poeta Baudelaire em carta ousada ao senhor Richard Wagner: “Sempre imaginei que um grande artista, por mais que esteja acostumado a gloria, não seria insensível a um elogio sincero”, mesmo porque, para aquele crítico X, com toda sua pose de crítico (esquecendo, talvez, que toda e qualquer manifestação de arte é uma expressão de cultura), e muitas vezes, absurdo de crítico que ele representa ser, ao reconhecer um artista e sua obra, limita-se a crítica acadêmica e a cátedra, esquecendo a emoção e o sensacionismo que levou o artista a escrever ou a esculpir suas obras.

O sensacionismo ao qual me refiro e ora me confronto inquieto na obra do Sr. D’Barros, expressa-se pela leveza, simplicidade e sensualidade através do ritmo de suas mãos quando tocam o barro, fazendo com que suas mulheres de barro ou bronze dialoguem entre si, conduzindo o imaginário do expectador, deixando-o suscetível à interpretação. As manifestações mentais as quais objetivo, pois se as faço é no espaço e no tempo, interpreto-as naquilo do que posso chamar de devaneio ou crítica:

“chega mais perto. Contempla a cegueira loquaz da mulher sentada e silenciosa, cravando unhas na cabeça do gato. As patas do gato se confundem com as pernas da mulher enquanto o rabo penetra a vulva da mulher sem pés. E ao sol, caminham, agora, não mais a mulher e seu gato, a mulher é cega e não têm pés, o gato agora já faz parte do universo fazendo pipi de barro, quem sabe?

Observa a luz que desliza sobre o nu na pele-bronze de três ninfas que em silêncios dialogam enquanto seus estáticos movimentos as conduzem paralém do sorriso! E, sem sorriso, deslizam através dos seios para um rio de ouro que deságua no nada. Enquanto a mãe aconselha segredos, ritos infindos, aos filhos mais novos, paralisados no tempo, revestidos de poeira.”

Luiz Gonzaga Xavier (o D’Barros), nasceu em São Paulo na cidade de Registro e hoje residente em Fortaleza, utiliza a técnica do barro e do bronze, constrói uma linguagem peculiar e poética, indo da criação ao eterno recriar através desdobramento do artista-operário que ele é, e posso dizer: sua obra, na linguagem da escultura é emotiva e sincera, arte imbuída de sensibilidade.

E que o crítico acadêmico Sr. X vá para o inferno!

Por: josé leite netto

poeta

terça-feira, 20 de novembro de 2007







Entre Cupins e Mallarmé


josé leite netto




10h.





O sofá já havia gasto. A tinta que sustentava meu coração à parede aos poucos caia. E despencando de um sonho, entre o ranger e outro da rede, lendo Mallarmé, deixo-me entre cupins e uma multidão de verbos espalhados pela sala. Praias e Várzeas esculpiam a eloqüência líqüida de areia manchada de sangue no tapete a se retorcer entre Quixotes e muinhos, enquanto sopro poeiras, versos e gaitas. Johnny Winter e Floyd se mantinham musicais, Jobim também toquinho tocou por aqui. Rener Maria Rilke aconselha-me a não escrever versos, o silêncio talvez se vestisse ao manto de Mallarmé. Silêncio! O cupim roedor é tocador de flauta.

“Não posso com o teu pó nas prateleiras.” Disse eu enrolando um latim na língua do enceto. E continuando com o dedo em riste...

“Se cada cupim soubesse do amor que tenho por esses objetos de Platão e Sade... com seus mistérios de Sintra, Vinicius e sua menina com uma flor, roterdã com sua loucura disfarçada e medieva... todos vieram a mim, ouviu! Cada um com seu lugar na estante, na minha pequena história particular.”

Mas o safado teimou a fumar ópio com Baudelaire e Pessoa. “Caminhemos de mãos dadas. É tempo de mortos faladores” espalhados pelo chão e minha mãe a gritar:

“Arruma tudo, o sofá chega amanhã.”

Ainda bem que ela foi ao barzinho. Disse-me enquanto o cupim me falava afiado:

“Ou tu me sopras ou te devoro.”

Mas a Desplanura por vezes é o Leme e o sonho de quem toca pífano no pensamento e pensa em ser uma Metáfora de Sol a se deixar com sua Cadeira na Calçada. As palavras podem ser rudes na guerra e paz de uma casa sendo pintada, enquanto o morador se vê às avessas mergulhado em pinceis e tintas. Neste momento, entre rodos e latas, o cupim passou correndo e juntou-se a barata do senhor K para uma partida de baralho com o gnomo do jardim. Verdade é que eu queria uma régua para medir quilômetros de Aurélios no universo recriado de palavras empoeiradas.

“Trouxeste a chave?” Perguntei.

”Não trouxe nada! E não entendo nada e pronto!”

Gritou o velho pintor de parede, com sua barba de Max, diluindo cores em busca de um trocado. Enquanto eu fingia ser cata-vento fazendo cachos.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

















Revolução no Espelho








Por José Leite Netto




A literatura assim como toda manifestação artística é um ato de amor, mas a arte de escrever supera a si, vai além do desdobramento que todo artista tem ao construir suas obras, chaga a dimensões longínquas o autor quando o seu Eu profundo fala consigo, com os Demônios que nele se combatem. Ela (a arte e seus gêneros) reflete como em um espelho a época da sociedade que a cerca, e em seu núcleo reluz seus sentimentos, o valor e o desvalor do mundo em que vive: com isso perpetua-se.

Contudo o artista existe para superar o mundo, ou melhor, para superar o mundo artístico que nele reside, porque a arte existe para ser superior a ela. Ela é uma evolução do tempo no espaço em que vive o artista em sua sociedade, pois aquele que critica a arte, critica por que consegue ver o que se encontra do “outro lado da ponte”. A arte só será arte quando for crítica de si e do universo que a cerca. No entanto deverá ela (a arte) se auto-superar para que nasça uma nova concepção como o quer o filósofo? Deverá tornar-se um movimento que se auto-sustente, se auto-edite, se fortifique? Ou deverá se auto-sufocar até que morra na mesmice das concepções de outros que estufam o peito com suas medalhas, dizendo-se senhor deste ou daquele movimento artístico independente ou acadêmico? É interessante notar que a literatura do século XIX perdurou porque existia nos escritores e nos artistas de sua época um quê de desespero e fadiga, hoje continua o desespero, o medo... Amanhã haverá comoção? Vamos às escolas das favelas, aos becos! De lá surgirão novos autores que, talvez, trocarão suas armas por outras armas – os pinceis, as canetas... Está seria a substância, a alquimia para um mundo melhor a fim de lançarmos nosso EU-POÉTICO para além do EU-ANALÍTICO, para o povo. O povo necessita pensar, precisa de uma mola que o impulsione, uma força motriz que o conduza para um mundo mais metafísico e menos violento.

Trotski em sua carta ao artista plástico André Breton, nos deixa claro a sua preocupação com o famoso movimento artístico revolucionário F.I.A.R.I (Federação dos Artistas Verdadeiramente Revolucionário e Independente), em que na época que estava exilado no México, devido a perseguição do ditador Stalen, escrevera pensando não só em sua geração perseguida, mas, creio dando luz para nosso mundo contemporâneo, quando afirma que a arte não deverá se prender a está ou aquela escola, por que a força artística começa pela luta pela verdade no sentido da fidelidade do artista a seu eu interior - sem mentiras. O EU-INTERIOR, sem sobra de dúvidas, é uma dualidade psicológica e sociológica onde se denota a preocupação de Trotski com o EU-SOCIAL e o EU-POÉTICO. Nota-se que havia uma idéia fixa com o social, não era o artista egocêntrico, fechado em suas metáforas, queria-se derrubar um moro que estava porvir. No Brasil, especialmente no século XIX, estava criada a famosa Padaria Espiritual numa ingênua antecipação da Semana de Arte Moderna de 22, fundada pelo poeta Antônio Sales que ao lado de Adolfo Caminha, Papi Júnior e entre outros editaram o jornal O Pão, veículo de comunicação que tentava dar um basta nos costumes afrancesados da Belle Époque, tinha-se que ser genuinamente brasileira a nossa literatura – nada de palavras francesas e poemas recitados ao pino. Mesmo naquela época em Fortaleza os Padeiros não eram “escritores obesos”, como se vê em alguns autores dos nossos dias, sonhando com seus fajutos prêmios literários mergulhados no uísque e na pompa, havia comoção naquela época de Sales, havia determinação nos artistas de todo século XIX ao fim do Século XX. Não iríamos muito longe se citássemos a poesia de João Cabral de Melo Neto, Carlos Drummond de Andrade, e o seu livro A Rosa do Povo, poemas encharcados de uma boa crítica social, gritando que “o poeta declina de toda responsabilidade contra o mundo capitalista e com suas palavras, intuições, símbolos e outras armas promete ajudar a destruí-lo como uma pedreira, uma floresta, um verme”. Vê-se o cuidado com o poemamundo, o homem no centro do capitalismo, combatendo o cotidiano. Eis a revolução na arte de que nos diz Trotski, arte sem mentiras e voltada para uma reflexão ao social, para uma futura conscientização de um mundo melhor. E se eles não mudaram o mundo todo, mudaram a maneira de pensar dos políticos, conseqüentemente do povo de sua geração.

Por fim sem querer aqui parecer um domador de animais nem tampouco um crítico de arte, coisa que não sou por profissão, apenas me analiso como autor, e se me analiso me vejo no espelho, combato meu inimigo para que ele enfraqueça ao tempo em que me fortifico.

segunda-feira, 24 de setembro de 2007


Renegados. Situação:
rock in’ jazz of blues








As noites boêmias, da House of Blues, aos domingos, no Centro Cultural Dragão do Mar, tem deixado a platéia descontraída. A banda Renegados, que há anos agita as noites cearenses, com seu rock in’ jazz of blues, apresentou uma diversidade musical que vai do recente CD, A Essência do Rock, ao som psicodélico de A Saucerful of Secrets da renomadíssima Pink Floyd para desfechar ao som do xaxado. A banda é um baú musical que vai ao gosto dos ratos de sebo a platéia mais comum. Embalada pela guitarra empolgante de Marcelo Pinheiro (vocal e guitarra) e Ricardo Pinheiro (batera e vocal) seguido de Romualdo Filho no contra baixo.
A essência do rock, segundo o próprio Marcelo Pinheiro, "não se limita a um estilo musical, pode-se ouvir jazz." O que desmistifica antigos conceitos de que rock é só pauleira. Com um repertório vasto e dois CDS na estrada, e com letras que abordam questões sociais, a banda Renegados, não deixar de lado o vigor da poesia que é presente em cada acorde.
Eclética, a noite não se deixou por menos no liquidificador musical da Renegados. Passaram também pelo palco Leonardo Escoleta, Aldemo JR seguido do sax afinado do Eliz Mário que sintetizou a fusão do jazz com o rock.
Vale a pena ouvir o rock cearense.

sexta-feira, 21 de setembro de 2007





Carnavalha
Romance de Nilto Maciel




Por José Leite Neto

Li Carnavalha como se brincasse no meio da avenida, bem que eu poderia ter deixado para escrever esta crônica em pleno carnaval completamente bêbado e pagão, pois assim é a grande festa do povo e assim é quase todo o desenrolar do livro. “O livro é um folião festivo do início ao fim”, já que eu poderia ser o Zuza, personagem central do livro. Carnavalha de Nilto Maciel é cheio de gritos, algazarras e traições. Escrito ao som de apitos e zabumba, com a navalha na carne. Na carne de Nequinho que cambaleou trôpego às punhaladas até cair por entre as pernas dos brincantes em meio às rezas de Maroca, que se benzia e mandava sua irmã Alzira se benzer ao tempo em que contemplavam tudo pela janela e gritava:


“Pecadores (...). Nequinho morreu tragicamente. E o irmão dele aí comediante.”


Conciso e bem escrito, Nilto Maciel, o cara da Revista Literatura, nos mostra neste seu novo romance - Carnavalha, personas descompromissadas e felizes com a vida em meio a grande festa da Carnavalma brasileira, senhoras ranzinzas e alcoviteiras, crianças brincalhonas penduradas em árvores com medo dos foliões que bêbados e aos poucos tomam ruas e calçadas. E é isso mesmo. Lembro-me de quando era criança e minha avó gritava para que entrássemos, porque era carnaval e os lapadas estavam soltos. No livro o leitor se deparará com uma multidão de carnavalescos com seus vaivens, de uma rua a outra, entre gritos e apitos fazendo com que o leitor se conduza às janelas, a assistir o espetáculo da festa que se forma a cada página virada.
A cena do interior da casa das irmãs Maroca e Alzira diz bem o contraste entre o religioso e o profano, às imagens dos santos na sala, postos em misericórdia, enquanto lá fora, blocos de foliões se demoram diante da fictícia platéia de moradores que escuta a dissonância da multidão dos brincantes.


Lê-se Carnavalha de um só gole, entre um balançar e outro da rede. O livro chega a deixar o leitor no meio da algazarra, em um carnaval fora de época, numa carnavalha criativa. Empolgante a obra retrata bem a cultura alegre do povo brasileiro, porque cheira a povo, com uma linguagem boa e leve - as gargalhadas. E, se o ofício de escrever é uma das profissões das mais árduas, nisto, Nilto Maciel está de parabéns, mas antes que me esqueça: sai de casa Nilto, vamos tomar uma cerveja.





Utilidade:
Carnavalha, 20 reais
Romance de Nilto Maciel
Editora Bestiário.